sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Família


A sociedade não é algo estático. Pelo contrário, está em constante redimensionamento. O homem deixou de ser nômade, domesticou seus animais, plantou, fez escambo, uniu seus entes mais próximos e se fechou em tribos. Dentro das tribos, elevou o masculino ao topo do poder e determinou às mulheres um legado: sujeição. As mulheres queimaram seus sutiãs, vestiram ternos e foram à luta. Trabalham. Hoje, sustentam núcleos familiares e comandam lugares antes destinados aos homens.
Interessante como a sociedade de animais racionais levaram a sério as determinações impostas no passado e que hoje parecem sedimentadas, quase que petrificadas em algumas tribos.
A igreja, mais especificamente a Igreja Católica, tentou afastar com todas as suas forças a idéia de prazer relacionado ao casamento e ao amor existente nesta união. Impôs a monogamia e deu significado sacro a união entre as pessoas. Nesse caso, determinou que a união fosse única e sacra, entre homem e mulher, necessária para se atingir o reino dos céus. Funcionou. Segue-se até hoje.
Juridicamente, a família carrega o tom arcaico da religião. Pudera, quem são os legisladores? Nossos digníssimos representantes são homens e mulheres presos a um passado o qual foi impregnado pelos ditames que mantém até hoje o mesmo ranço simplório do conceito da dinâmica familiar.
Família, sociologicamente falando, tem uma definição que enfatiza os laços formados pelos sentimentos de um agrupamento social seja ele qual for. É um núcleo que garante a sobrevivência digna, proporcionando estabilidade social e material aos seus componentes, com valores éticos e humanos
A partir das últimas décadas do século XIX, as relações familiares tomaram novas dimensões. A história aponta mudanças sociais que definiram e tiveram grande importância na reformulação da família. Porém, isso não significa que a família esteja em crise. O que ocorre é uma transformação decorrente das mudanças sociais, pois, a estrutura familiar não é mais a mesma, não sendo regida pelo patriarca exclusivamente.
Mas, hoje, há um novo ponto a ser observado. É o afeto que norteia todas as relações entre as pessoas, sejam tais relações amorosas ou comerciais, fazendo com que as leis acompanhem o momento social, uma vez que, em uma perspectiva histórica, o fato social antecipa-se ao jurídico, e a jurisprudência antecede a lei.
Devido às objeções morais ainda remanescentes em nosso meio, a sociedade nega-se a discutir o tema e insiste em ignorar a necessidade de dar proteção legal à união homoafetiva. A justificativa de que o Estado protege o casamento heteroafetivo e proíbe o casamento homoafetivo para proteger o sexo reprodutivo como finalidade da vida é falso, uma vez que a cada ano observam-se caríssimas campanhas políticas para controlar a natalidade, assim como se vê próxima a legalização do aborto.
Enquanto a lei não acompanha a evolução dos usos e costumes, as mudanças de mentalidade, a evolução do conceito de moralidade, ninguém, muito menos os aplicadores do direito, podem, em nome de uma postura preconceituosa ou discriminatória, fechar os olhos a essa nova realidade. Não se podem confundir as questões jurídicas com as questões morais e religiosas.
A família não é mais o papai, a mamãe, o filhinho e o cachorrinho, ou melhor, não somente esta é a formula de uma família. Papai e papai, filhinho e gatinho, ou mamãe e mamãe, filhinha e peixinho também. Vamos abrir nossos olhos, colocar o tema nas nossas conversas, desmistificar o mito e o erro do preconceito. Vamos ser gente, minha gente.

Fonte: União homoafetiva – o livre exercício do afeto e o acesso a justiça. Do mesmo autor do artigo.

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